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Romance Domingo é obra para provocar alunos sobre as miudezas da vida

Resenha Literária

Edição N.º 22 - Novembro de 2022

Que dia da semana é hoje? E que sentimento esse dia da semana costuma despertar em você? A gente sabe que a segunda-feira vem com uma carga de ser o primeiro dia útil da semana, um dia de recomeços, um dia de promessas, um dia de desafios. E a sexta-feira? Não é à toa que a hashtag #sextou seja uma expressão comumente carregada de alegria com a chegada do fim de semana. Será que todo mundo tem os mesmos sentimentos em relação aos diferentes dias da semana? O quanto o nosso contexto social, a nossa trajetória de vida e as nossas relações afetam nossa vivência e a nossa rotina?


Na edição deste mês, vamos falar sobre o livro “Domingo”, de Ana Lis Soares. Na obra, a escritora mineira se inspira nos sentimentos e sensações desse dia da semana para tecer histórias de sete “personagens-ilhas”, cujas alegrias e tristezas vão costurando o enredo do romance. O livro foi contemplado pelo Programa de Ação Cultural do estado de São Paulo (ProAc) em 2020, e selecionado pela Secretaria Municipal de Educação da prefeitura de São Paulo, enviado a todas as escolas da cidade.

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Conheça a obra e a autora de Domingo — por Ana Lis Soares.

Não são poucos os alunos que deixam de conceber um texto ou de dar vida a uma história, por não acreditarem na beleza que existe nas miudezas. Em uma geração alimentada pela velocidade das redes sociais e pela grandeza das grandes produções cinematográficas, o desafio é parar. Não é à toa que as práticas contemplativas têm ganhado espaço também na sala de aula. Além de todos os benefícios físicos e psicológicos que existem no contemplar, há ainda o espaço para o aprofundamento, que tanto ajuda na aprendizagem.

Em seu romance de estreia, Domingo, conhecemos a sensibilidade da escritora Ana Lis Soares. Mineira da cidade de Passos, Ana Lis começa seu livro assumindo que não veio com a intenção de narrar grandiosidades. “O que conto são detalhes, fracassinhos cotidianos ou alegriazinhas escondidas em pensamentos que surgem do estômago. A graça vem em forma de susto - e já passou. (Pessoas e seus mistérios, é essa a minha matéria.)”

Domingo é um romance que conta as histórias de sete protagonistas - sete mulheres, que a escritora chama de “personagens-ilhas”  -  durante um único dia, o próprio domingo. “No percorrer da narrativa, essas histórias vão sendo entrelaçadas, costuradas por relações mais evidentes entre as personagens ou por sentimentos, vivências, temas mais sutis…”, conta a escritora. “Tanto o domingo  -  que é atmosfera, fio condutor e espécie de personagem do romance - quanto as experiências dessas mulheres ligam umas às outras de muitos modos”, continua.




No romance, são tratados temas universais como o luto, a maternidade, o amor e temas sociais, como o abandono paterno, a violência urbana, o preconceito e os relacionamentos tóxicos.


Segundo a escritora Maria Valéria Rezende, que assina o prefácio, “este romance tece-se como uma manta de barafunda […]. Cada capítulo tem o nome e a história de uma mulher, mas, na verdade, do conjunto poderíamos dizer que conta a vida de todas as mulheres, os desafios comuns a todas elas, atravessando barreiras de raça, classe, meio de subsistência, religião, arranjos familiares, campo e cidade, revelando um possível caminho de futuro para toda dor silenciada, toda luta feminista e, ainda, os fundamentos de um conceito de uso recente e necessário, o de interseccionalidade.”

A gestação desse livro foi lenta e isso pode ser percebido também em sua profundidade. Ana Lis é jornalista, filha de escritor/publicitário e de professora/jornalista. Exerceu o ofício de 2012 a 2019, quando começou a produzir conteúdo sobre livros e literatura para redes sociais (Instagram e YouTube). Fora das redações, concluiu um sonho que começara na adolescência. Começou a pensar no Domingo em 2006 anos, aos 17 anos, e publicou a obra, pela editora Instante, em 2021.

“Tudo começou com reflexões em torno de sensações que o domingo me despertava — havia algo nesse dia da semana que o fazia diferente de todos os outros, sabe? Olhava para as pessoas, para minha vida, para as coisas e pensava: domingo revela o que temos de mais humano em nós. Não há como fugir do domingo! É um dia de paradoxos: entediante e sufocante, delicioso e angustiante, começo e fim da semana…”

Na obra, conhecemos Beatriz, que atravessa o dia imersa em lembranças e desejos, sobretudo o de se reconectar com a filha, Amanda; Bárbara, artista plástica fascinante, viva no corpo e no pensamento de seu companheiro José; Sofia, que, prestes a dar à luz, se dedica a se reconciliar com a memória do pai ausente; a adolescente Isabella, que lida com o divórcio dos pais sem perder a ternura na relação com a avó, sua maior joia; Omolara, que, na força da ancestralidade, buscou a ponderação para criar os sobrinhos e se acalenta a cada conquista dos dois; Antônia, mãe de oito, avó de seis, um coração pleno de amor e marcado pela crueldade do assassinato de um filho; e, por fim, Carolina, jovem enfermeira, que se fortalece para dar fim a um relacionamento abusivo.

A narração em terceira pessoa permite que o leitor tenha uma observação profunda das personagens e das transformações pelas quais elas passam. Ainda que a ação aconteça em um único dia, um mesmo domingo, o leitor consegue compreender o que as personagens passaram para chegar até ali e a interdependência que existe entre as histórias narradas.

“O domingo é uma presença constante na obra, uma espécie de personagem invisível, mas pulsante. É fio condutor, pois talvez seja a ligação mais óbvia entre as sete histórias/sete personagens retratadas. Por tudo isso, digo que domingo é tanto atmosfera (ou seja, espaço) quanto tempo no romance — já que acompanhamos as personagens ao longo do passar das horas de um único domingo, mas também vivenciamos o próprio dia, o seu calor, as suas vozes, os encontros e desencontros… Esse ambiente familiar”, afirma a autora, que revela:

“Depois que publiquei o Domingo, aliás, muitas pessoas vieram me contar suas percepções, seus sentimentos e suas memórias em torno desse dia da semana. É curioso. Por isso, deixo aqui a pergunta para quem nos lê: o que é domingo para você? Qual a marca do domingo em sua história? Quais os sentimentos ele desperta em seu corpo?”

Ainda que costuradas, as narrativas são independentes e permitem ao leitora que os capítulos sejam lidos fora de ordem. Fica aqui a sugestão então para um projeto de literatura, que pode ser trabalhado com alunos de diferentes faixas etárias, contextos e espaços.

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